O Dia Do Estudante - a educação da insubordinação

No passado dia 24 de Março assinalou-se o Dia do Estudante. Nem de propósito, a efeméride surge numa altura em que as televisões nacionais destacaram o incidente decorrido numa sala de aula que opôs, por um lado, uma professora que retirou o telemóvel a uma aluna, por outro, essa que exigiu, de uma forma bastante violenta, a devolução do aparelho.

Esta situação, de tal forma preocupante, acabou por lançar o debate que há muito pairava na mente de muitos: a questão da falta de respeito de alguns alunos pela escola e a falta de poder dos docentes para controlar atitudes dos alunos que, não raras vezes, resultam em actos de violência verbal e física.

Argumentação dispersa vinda dos mais diversos sectores dá-nos conta de que algo se passa de muito errado nas escolas e na sociedade em geral, para que se possa permitir que os alunos, utentes que são de um sistema de ensino massificado e aberto a todos, se dêem ao luxo de pensar que sairão incólumes de um confronto com aqueles que mais directamente administram a educação em Portugal: os docentes.

O resultado de políticas «frouxas» e «permissivas», que admitem a continuidade dos alunos no sistema apesar de recorrentes processos disciplinares ou atitudes de insubordinação; o resultado do «facilitismo» que permite que os alunos passem administrativamente os anos lectivos, numa ânsia de se atingir os indicadores europeus de absentismo escolar; o resultado directo do ataque social, personificado na pessoa da Ministra da Educação, que tão arrogantemente colocou a classe profissional dos docentes em «xeque» ao passar a ideia de que são profissionais pouco capazes, que temem a avaliação e que, no fundo, «não se querem chatear»; o resultado da falta de educação que os alunos deveriam receber em casa, numa altura em que os pais apenas se preocupam com a manutenção dos seus filhos(as) na escola durante o período normal de trabalho; o resultado do falhanço da escola como veículo de «boas maneiras» à moda antiga, uma vez que são muitos os que se lamentam por a escola se ter tornado tão pouco «disciplinadora»; entre outros argumentos apresentados para tentar explicar as causas do ponto a que chegámos.

A argumentação das razões deste fenómeno é, efectivamente, bastante heterogénea e aponta como responsáveis os mais diversos agentes sociais. Não obstante, existe um sentimento geral de que o problema está ora nos pais, ora nos filhos, ora na escola. E é este o sentimento que prevalece e que, comparando os casos de violência entre os alunos portugueses e outros, como por exemplo os nórdicos, acaba por nos fazer sentido: a sociedade como um todo (o somatório que é dos agentes individuais da família e da escola) está a falhar no seu papel disciplinador.

O problema não passa apenas pela escola, quando os alunos não são disciplinados em casa; da mesma forma que não é eficaz discipliná-los em casa quando na escola podem dar azo à sua raiva e frustração. O problema, em primeira e última análise, reside na sociedade. Em cada um de nós como agentes sociais e individuais de uma pertença comunitária.


Ao ver o vídeo que circulou na Internet e que acabou nas televisões nacionais, com a aluna agarrada à professora que não lhe devolvia o telemóvel, numa atitude irracional e quase animalesca de birra adolescente, não pude deixar de pensar na forma passiva como os restantes alunos assistiram à cena, e como o aluno que filmava o acontecimento se preocupava apenas em gravar tudo e que quer um, quer todos, nada fizeram para ajudar a professora. Ou refrear a aluna.

Este tipo de situação é sintomático de uma sociedade que se torna cada vez mais passiva, embora latente na sua violência, na qual já não se trata da falência de valores específicos mas da falência do papel comunitário de introdução de valores. Enquanto continuarmos a observar a desgraça dos outros através de um ecrã de televisão, indiferentes e entretidos com o espectáculo, como se nada daquilo tivesse que ver connosco, continuaremos a assistir à falência dos nossos valores humanos espelhada nos mais variados casos: a aluna que agride uma professora; o polícia que abusa da autoridade; o passageiro do metro que pontapeia uma rapariga por ser diferente, como no ano passado, em Espanha; o jovem que atira a garrafa de cerveja para o chão nas festas da cidade e ninguém lhe diz nada; entre outros exemplos, tantas vezes presenciados por todos nós e tantas vezes ignorados.

A reflectir na celebração do Dia do Estudante, não consegui deixar de pensar que a «escola para todos» só será verdadeiramente uma escola de todos, quando todos nós, pertencentes directa ou indirectamente à comunidade escolar, assumirmos o nosso papel comunitário e passarmos a agir condizentemente.

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