A (des)responsabilização da indisciplina

No rescaldo da célebre questão da aluna que agrediu a sua professora por causa de um telemóvel, e em resposta ao Procurador-Geral da República, o Bloco de Esquerda mostrou-se completamente contra qualquer tipo de judicialização da indisciplina nas salas de aula.

Pessoalmente, para mim que considerava a Ana Drago um exemplo a seguir, esta tomada de posição veio confirmar a ideia despreocupada e inconsequente do Bloco de Esquerda ao tratar de assuntos de educação, já antevista aquando da proposta de aulas a pares de línguas estrangeiras. O Bloco de Esquerda apresenta um discurso bastante apelativo aos jovens de classe média, que, chateados com o mesmo em todo o mesmo lugar, continuam a pugnar por uma visão utópica da prática. A teoria funciona sempre na discussão intelectual da esquerda-mais-à-esquerda mas revela, em última instância, um desfasamento da realidade deveras preocupante.

O que o Bloco de Esquerda parece esquecer, sob o manto protector das liberdades do indivíduo-estudante, é que há uma franca diferença entre o conceito de «indisciplina» e «crime». Configura-se como «indisciplina» toda a falta de acatamento de decisões do docente, por parte do aluno, assim como manifestações mais impulsivas de discordância e tomadas de posição que deverão, mais que tudo, ser encorajadas como mecanismo de argumentação e de defesa dos direitos básicos dos cidadãos activos e participativos. Não queremos, de forma alguma, alunos estáticos, presos a um conjunto de regras às quais obedecem cegamente, sem poder de discussão nem discordância. Pelo contrário, precisamos formar alunos pensantes, criativos e com poder de decisão e de pensarem pela sua cabeça. Nesta abordagem, são muitas as manifestações por parte dos alunos que poderão ser entendidas pelos docentes como «indisciplina».

Outra coisa completamente é a o «crime» de agressão física e o atentado à integridade física ou moral do docente por parte do aluno. Quando se atinge este patamar de insubordinação já não poderá ser apenas a escola, como defende o Bloco de Esquerda, a tomar o pulso à situação. A escola, como espaço de educação e formação que é, deverá pugnar sempre pela manutenção de um certo «status quo» que permite, senão mais do que, pelo menos a estabilidade da tradição. Mas a escola não pode sobrepor-se ao papel das forças de segurança pública que trabalham no nosso país.

Se um aluno agride um docente, a resposta a esta situação não estará de forma alguma na aplicação de sanções disciplinares dentro do campo escolar, até porque o crime em questão extravasa a comunidade escolar e desemboca num atentado social, altamente reprovável e, como tal, punível civilmente.

Compreendo a argumentação teórica, mas não posso aceitar a expressão prática desta ideia. A escola não é um substituto social. Vive e trabalha em conjunto com a sociedade cá fora e, como tal, quando a questão se impõe a um nível de atentado à liberdade individual, consagrada na Constituição e não num regulamento interno de uma instituição de ensino, então as sanções aplicadas terão de ser de índole social e nunca escolar.

É precisamente por esta separação entre escola-sociedade (à laia da laicização do estado) que permite que uma aluna agrida uma professora (ou vice-versa) e nada lhe aconteça do ponto de vista social.

Que pena, Ana, agora que começava a achar-te diferente...

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